
PRECISO FALAR ALGO FORTE
Humberto Ilha
Humberto Ilha
A campanha pela duplicação da BR-101 em Santa Catarina é louvável em todos os aspectos, menos no foco. A bandeira mais desfraldada pelos populares é "a morte na rodovia”. Todo santo dia morre alguém que ousa encarar a megera indomada. E é aqui que peço licença para falar algo mais forte. Esse argumento jamais vai tirar o sono dos burocratas.
Conheço um padre que, ao encomendar um defunto, começa dizendo: “Irmãos, este corpo que aqui está, nós temos que sepultá-lo imediatamente”. Nada mais certo. Primeiro porque isso tira o foco do corpo físico do morto para valorizar-lhe a alma indestrutível (de acordo com a fé geral). E segundo, porque de verdade, não resta nada mais a fazer. Para as autoridades, quem morre precisa é de um bom enterro. Ao invés de mostrarmos as cruzes dos nossos sepultados, devemos enchê-los de fotos e filmes dos que sobreviveram aos acidentes. E essas pessoas são mais de noventa por cento. Uns estão até hoje em hospitais. Outros estão mutilados. Outros viraram alcoólatras, depressivos e desesperados. E quanto está custando isso tudo?
Perceberam agora quão forte estou falando? É de assustar. Se para nós uma vida não tem preço, para os burocratas o que tem preço é o acidentado que teima em viver. Esse incomoda e se transforma num centro de custos que sangra o Tesouro. E se incomoda, vamos mudar o foco da nossa campanha já. E o morto? Só nos resta sepultá-lo no silêncio da nossa dor, para que não acorde quem descansa no Planalto.
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