quarta-feira, 4 de novembro de 2009

QUEM ATIROU EM PITUCA?

A veterana cadela Pituca obedeceu ao comando recebido de ir para o meio da rua. “Passa, vá mais prá lá!” Era ordem vinda de gente conhecida; dois agentes da Penitenciária de São Pedro de Alcântara. Portanto, não havia porque não obedecer. Mas a coitada nem chegou a se distanciar cinco metros. Recebeu vários balaços nas costas e ficou agonizando a noite toda. Decerto ficou surpresa diante da agressão à falsa fé. Com certeza olhou para os bandidos, sim, porque isso é coisa de bandidos, e num fiapo de voz perguntou igual Michael Jackson ao repórter inquisidor que o massacrava com perguntas íntimas: “Por que você está fazendo isso comigo?” Ou talvez dissesse aos dois anjos negros: “Se isso vos dá intenso gozo, tirai-me a vida, muito embora não ma destes. Nem vos compreendeis ainda. Haveis de, nalgum dia, padecerdes no meu lugar. Não para aplacar-me a vingança, pois que dela não me valho. Mas para que aprendais o valor das coisas no universo. Para que conheçais a essência da piedade e a grandeza do espírito. Para que aprendais, sozinhos e na dor, a tirardes vossas almas das trevas. Para que vos seja tudo mostrado, o grande e o pequeno, o primeiro e o último, e tudo aquilo que se encontra no meio. Para conhecerdes, ainda neste mundo, o infinito da matéria, a imensidão da natureza, os céus, as terras, os mares e suas ondas. Para aprenderdes a ser úteis e felizes. Senão, morrereis com muita carne e pouco espírito”. Isso parece discurso de tribuno ou poeta, mas bem poderia ser o discurso interno de todos nós para a defesa das pessoas e dos tutelados animais. Isso que eles cometeram é crime tipificado na Lei Federal de Proteção aos Animais vigente há mais de setenta e cinco anos.
Uma coisa dessas só pode vir da arrogância milenar e até bíblica de achar que o homem é superior aos animais e deles pode se servir como bem quiser. Diminuir a população de cães nunca deu certo pelo viés do sacrifício, que é sempre agonizante. Em médio prazo o melhor é controlar a população canina pela via da esterilização, dizem os técnicos em zoonose.
Encontrada no dia seguinte agonizando, Pituca agora vive graças à compaixão de um médico veterinário (Marcelo Fricki, de São José) que lutou em favor do bicho durante quatro horas de cirurgia. As balas entraram pelas costas, atravessaram o corpo frágil e saíram pelo ventre do bichinho. Isso está dificultando a investigação da Secretaria de Justiça e Cidadania. Nem precisa, pois todos na comovida comunidade carcerária já conhecem a autoria. Uns crápulas desses e suas proezas abomináveis deixam rastros de horror até nos corredores do inferno.

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